APRESENTAÇÃO

 

            Apresentar uma obra acadêmica, em tese, é tarefa que exige mais rigor e consistência, condensando o que se pretende expor, contudo sem prejudicar a essência do que cada autor, no caso, se propôs socializar, fazendo-o, tanto quanto possível, de forma a despertar o interesse maior dos leitores potenciais. A edição especial do segundo semestre de 2012, da Avepalavra Digital não é exceção. Registre-se também, que as contribuições da professora Berta Lúcia Tagliari Feba, e do professor Paulo César Tafarello, para que o conjunto da obra fosse produzido, viabilizaram aos autores dos respectivos artigos e aos correspondentes pareceristas, condições imprescindíveis para que tudo chegasse a bom termo. Particularmente, sinto-me agraciado em ter sido lembrado para colaborar, cumprindo parte do meu papel na Academia, qual seja, atuar no campo das produções intelectuais e sua divulgação.

            No mundo predominantemente capitalista em que vivemos, seja no âmbito da democracia capitalista (países centrais) seja no do capitalismo democrático (países periféricos), o pragmatismo reinante cobra “resultados” proporcionais aos recursos orçamentários e financeiros “investidos”. Obras que não permeiem o retorno dos ativos são tidas como exclusivamente subjetivas, teóricas, que não provocam transformações “visíveis”, “impactantes”, que efetivamente redundem no “aumento do capital”, e de quebra, na “melhoria das condições sociais”. Sob tal ótica, não é difícil concluir que os interesses convergem, dentre os vários ramos da Ciência, para as que contemplam as Exatas e da Terra, Biológicas, Saúde, Agrárias e as Sociais Aplicadas.

As Ciências Humanas, Letras, Linguística e Artes, em regra, são relegadas à condição de analogia, no embate entre situação e oposição, como, no caso da última, necessária para a legitimação do que se convenciona chamar de democracia. Por inferência, lamentavelmente podemos concluir que, igualmente em regra, obras de cunho humanístico não ocupam o espaço privilegiado no ápice da pirâmide do saber sistematizado, que lhes cabe, pois o ser em questão é “humano”, e como tal, une razão e emoções, questiona, é questionado, deveria raciocinar da causa para o efeito, por fim, transitar por um mundo mais solidário, fraterno, “plástico”, “sonhador”, com a cumplicidade necessária, para tanto, comunicando-se apropriadamente, polêmicas à parte, quanto a isso.

Feitas tais considerações, entendo que se faz mister adentrar ao conteúdo de cada artigo e da resenha produzidos, que compõem esta obra. A ordem estabelecida pode não ter sido a que contemple um ou outro, porquanto a temática definida no conjunto também pode ser objeto de questionamento no que tange à transversalidade pretendida, contudo, é minha pretensão aproximar-me, tanto quanto possível, da mesma.

A Apresentação feita, propriamente dita, principia pela importância do ensino de gêneros orais na formação do aluno como sujeito ativo na sociedade; caminha pela aplicação do portfólio no estágio supervisionado de literatura: pausa para o exercício da reflexão; detém-se no método comunicacional como base ao ensino: uma prática possível; e por afinidade, aos caminhos do leitor na leitura hipertextual, avançando para o desenho animado contemporâneo: intertextualidade, poesia e plurissignificação, e os quadrinhos na era digital; como também, por fim, envereda pelos parâmetros curriculares nacionais de língua portuguesa; sequência didática no enfoque feito; e evidencia o papel do professor e da escola reflexiva, de acordo com os autores elencados.

O autor Irando Alves Martins Neto, em seu artigo “A IMPORTÂNCIA DO ENSINO DE GÊNEROS ORAIS NA FORMAÇÃO DO ALUNO COMO SUJEITO ATIVO NA SOCIEDADE”, afirma que pretende indicar a relevância do ensino de gêneros orais como colaborador para a plena participação do aluno-sujeito na sociedade, fundamentando-se em referenciais teóricos acerca de linguagem e educação. Afirma também, que sem um trabalho planejado que tenha como centralidade o desenvolvimento da oralidade não é possível atingir os objetivos determinados pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). Sugere algumas atividades de língua falada, as quais poderão ser realizadas em diferentes séries dos ensinos fundamental e médio, objetivando colaborar com as práticas de professores de Língua Portuguesa, com a finalidade de que esses educadores consigam melhor preparar seu educando para o mundo vivido fora da escola.

Na sequência, Hiudéa Tempesta Rodrigues Boberg e Rafaela Stopa, discorrem sobre “APLICAÇÃO DO PORTFÓLIO NO ESTÁGIO SUPERVISIONADO DE LITERATURA: PAUSA PARA O EXERCÍCIO DA REFLEXÃO”, e em seu artigo pretendem divulgar os primeiros resultados da aplicação do portfólio como um dos instrumentos de avaliação na disciplina de Prática de Ensino de Literatura, do curso de Letras com habilitação em Português e Literaturas de Língua Portuguesa, de uma IES hoje integrada à Universidade Estadual do Norte do Paraná – UENP/Campus Jacarezinho. Para tanto, abordam o conceito de portfólio, com fundamentação nos autores portugueses Carlos Ceia e Idália Sá-Chaves, e trazem uma breve contextualização de circunstâncias relacionadas à sua aplicação no referido curso, utilizando-se de fragmentos retirados de portfólios de alunos formados em 2007, os primeiros a produzi-los, para análise de sua eficácia. Compartilhando tais reflexões, esperam evidenciar que a elaboração do portfólio, no último ano da graduação em Letras, é uma oportunidade singular para que o aluno possa avaliar a sua trajetória como estagiário, ao mesmo tempo em que reflete sobre a postura do professor de educação básica em sala de aula, reafirmando os valores humanísticos essenciais para o exercício da profissão.

A abordagem de Rubiamara Pasinatto e Ieda Marcia Donati Linck converge para “O MÉTODO COMUNICACIONAL COMO BASE AO ENSINO: UMA PRÁTICA POSSÍVEL”, considerando, segundo elas, que é inegável a relevância da disciplina de Literatura diante da amplitude do universo que pode se abrir a partir dela. Para as autoras, isso é mais factível ainda diante das várias possibilidades que se apresentam de diversificação dos textos literários que viabilizam o contato dos alunos com um universo de singular beleza, magia e emoção. Afirma que o ensino desta disciplina deve ser antes de tudo, uma imersão em um mundo de subjetividade e encantamento, um lugar mágico, onde o aluno localiza a possibilidade de se descobrir, de se reconhecer e de se encontrar enquanto sujeito. Diante disso, apresentam uma proposta de prática pedagógica de trabalho com o período Pré-Modernista, a partir de alternativas embasadas no Método Comunicacional que segue a teoria de Roman Jakobson.

Por sua vez, Berta Lúcia Tagliari Feba, principal organizadora desta obra, opta por fazer uma apreciação do e-book Ler e brincar: atividades de leitura literária com jogos de construção narrativa, coordenado por Vera Teixeira de Aguiar (EDIPUCRS, 2008). Realiza tal pretensão descrevendo quais são os caminhos possíveis percorridos pelo leitor ao longo de sua leitura interativa com o texto. Atendendo ao seu propósito, pondera sobre o modo como ocorre a relação entre leitor e texto diante da estrutura hipertextual, quais são as estratégias utilizadas pelo leitor e quais os caminhos trilhados no momento da leitura. Conclui que é possível notar que a mudança de suporte de leitura pressupõe alteração do comportamento do leitor, tanto no que tange à sensibilidade estética, quanto na interação com a matéria lida.

“O DESENHO ANIMADO CONTEMPORÂNEO: INTERTEXTUALIDADE, POESIA E PLURISSIGNIFICAÇÃO”, é artigo produzido por Fernando Teixeira Luiz, afirmando que as animações destinadas ao público infanto-juvenil constituem produtos de inegável impacto no mercado cinematográfico contemporâneo. Para ele, tais animações seduzem, encantam e emocionam mediante roteiros que, marcados pelo hibridismo, transitam da comédia ao drama, do suspense à aventura, do romance ao musical. A partir de tal quadro, considera que a pesquisa realizada ocupou-se em discutir o caráter artístico e ideológico de algumas animações que circulam dentro de unidades públicas e privadas de ensino de Presidente Prudente (SP). Na sequência, discorre sobre a metodologia adotada, a opção pelo ensino médio, detém-se em alguns detalhes e por fim afirma que as narrativas examinadas sublinham espaços trans-reais, tomadas em travelling e estrutura essencialmente linear. Em síncrese, se firmam como produções muito polissêmicas, que exigem do leitor a função de preenchimento dos “vazios” evidenciados em suas respectivas malhas textuais.

Nad Pereira Leite Borges, por sua vez, decide resenhar: Quadrinhos na internet: abordagens e perspectivas, de Márcia Veronezi, afirmando que o mesmo é na verdade uma dissertação de mestrado que se transformou em livro. Para ela, os textos apresentam uma proposta interessante de releitura do mundo imaginário dos quadrinhos através de reflexões inusitadas e originais da autora sobre as transformações iconográficas do mundo contemporâneo. Segundo a resenhista, Veronezi estabelece na obra um abastado diálogo interdisciplinar a partir de um histórico da arte de representar – dos quadrinhos desenhados aos quadrinhos digitais – fazendo-nos perceber a libertação do homem no mundo, no espaço e no tempo, analisando também como o universo dos quadrinhos se insere na pós-modernidade e é influenciado pela era digital. Nad Pereira discorre rapidamente sobre o currículo da autora Márcia Schmitt Veronezi Cappellari, suas referências, a estrutura da obra, e comenta cada capítulo da mesma, bem como as considerações de tal autora. Afirma ainda que a linguagem adotada é muito acessível, e como esta autora constrói seus argumentos, explorando ilustrações quadrinhísticas, tornando a leitura mais agradável. Encerra sua resenha dizendo que “O livro é indicado aos amantes dos quadrinhos e do cyberespaço, como também, a todos aqueles que se interessam pelo estudo das mudanças que a pós-modernidade provocou na estrutura e no conteúdo das historietas”.

Os autores Tânia Cristina Lemes Machado, Gislene Aparecida da Silva Barbosa e o que ora faz a apresentação em pauta¸ fecham a edição, respectivamente, com dois artigos e uma resenha, que, pela ordem, abrangem temáticas igualmente relevantes para o cotidiano de cada educador, quais sejam: Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa, que constituíram um marco no cenário educacional brasileiro por proporem o ensino de leitura e escrita focalizado numa concepção de linguagem pautada em práticas sociais, realizadas em condições sócio-históricas definidas, privilegiando, segundo Tânia Cristina, o desenvolvimento de competências discursivas, articulando-se a dois eixos: o eixo do “uso”, que compreende a língua oral e escrita, e o da “reflexão”, envolvendo a língua e a linguagem; Já, Gislene Aparecida, apresenta o procedimento Sequência Didática, relacionando-o ao ensino do gênero discursivo Artigo de Opinião e destacando sua importância para as aulas de Língua Portuguesa na escola básica. Analisa também o material “Pontos de Vista”, integrante das ações da Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro, evidenciando o quanto tal recurso, disponível em todas as escolas públicas de Ensino Médio, é significativo para o desenvolvimento de uma Sequência Didática voltada ao trabalho com a leitura e a escrita do Artigo de Opinião. Concluindo com uma resenha, o ora apresentador da edição em tela, afirma, ao examinar e resenhar ambas as obras anunciadas no sumário, que, enquanto a primeira obra, organizada por Pimenta e Ghedin, enfoca o Professor Reflexivo, a segunda, organizada por Alarcão, aborda a Escola Reflexiva. Portanto, ambas estão direcionadas para a necessidade da reflexão, em âmbitos distintos, mas afins, ou seja, o lócus formal onde ocorre a escolarização, e um dos atores principais, o professor. Constata também que os autores convergem para o objetivo maior, que é uma conceituação adequada de Escola Reflexiva e de Professor Reflexivo, e mais que isso, a pretensão de contribuírem para o aprimoramento do processo educativo, principalmente no âmbito formal, o que não significa que inexistiram pensamentos discordantes, divergências teóricas e até mesmo pragmáticas. Opina ainda no sentido da convergência com o ideário de Alarcão, quando esta elenca os problemas concretos identificados, praticamente generalizados, ou sejam: o insucesso escolar, a indisciplina e o desinteresse, que somados, explicam com clareza as razões principais do fracasso do processo de escolarização, já mencionada a influência do regime econômico-financeiro vigente na maior parte do mundo globalizado e no Brasil.

Relevância do ensino de gêneros orais; aplicação de portfólio no estágio supervisionado de literatura; método comunicacional como base ao ensino; caminhos do leitor na leitura hipertextual; desenho animado contemporâneo; quadrinhos na era digital; parâmetros curriculares nacionais de língua portuguesa, sequência didática na abordagem feita, e o enfoque dado a partir das obras resenhadas pertinente ao professor e à escola reflexiva, podem não atender, segundo a ótica capitalista imediata, os interesses determinantes do capital. Todavia, que oferecem opções “pedagógicas” aos docentes, e uma reflexão provocadora para uma viagem ao imaginário dos educandos, disso estou convencido. Como tal, confirma a necessidade de que as ciências humanas contribuam sobremaneira por um ser mais politizado, que sonha, mas não somente isso, luta pela transformação pretendida, por uma sociedade efetivamente mais humana.

 

 

Professor Doutor Milton Chicalé Correia

Coordenação Pro Tempore do Curso de Letras

Câmpus da Universidade do Estado de Mato Grosso

Alto Araguaia (MT)